Dom João Justino de Medeiros Silva
Arcebispo de Montes Claros
Há poucos dias celebrávamos o Natal do Senhor. Junto das festas, dos encontros, viagens, ceias, em todo o mundo cristão muitos trocaram presentes. Especialmente as crianças – não todas, com certeza – puderam alegrar-se ao desembrulhar um presente. Promessas, expectativas, sorrisos, alegrias. Gestos de solidariedade permitiram a oferta de presentes, mormente brinquedos, para crianças mais pobres. Cestas básicas foram distribuídas aqui e ali para famílias carentes. Tudo isso marcado pelo espírito natalino que toca os corações e mobiliza sentimentos de fraternidade e de partilha. A destacada figura do Papai Noel, originalmente inspirada em São Nicolau, bispo, aponta para a bondade paterna que providenciará o necessário para a alegria de cada um de seus filhos e filhas. Ele traz presentes para cada criança.
Também a liturgia nos dá oportunidade de escutar, na festa da Epifania ou no dia de Santos Reis, o relato evangélico da visita dos magos do Oriente ao menino Jesus que nascera em Belém da Judéia. Conta São Mateus que os magos “ao entrar na casa, viram o menino com Maria, sua mãe, e, prostrando-se, o homenagearam. Em seguida, abriram seus cofres e ofereceram-lhe presentes: ouro, incenso e mirra” (Mt 2, 11). Os Padres da Igreja compreenderam esses presentes como sinais da realeza (ouro), da divindade (incenso) e da paixão (mirra) do menino Deus. E a tradição dos presépios não deixou de representar os magos com seus dromedários se aproximando da manjedoura que abraça o pequeno Jesus. Para os cristãos, o maior de todos os presentes é o próprio Jesus. Sim, Deus amou tanto o mundo que lhe deu o seu Filho unigênito” (Jo 3,16). Jesus é Deus conosco e sua chegada expressa o cuidado amoroso de Deus pela humanidade.
Na sociedade de hoje, a prática de oferecer presentes, seja no tempo do Natal ou em outras datas especiais, parece ter se distanciado do significado de marcar presença por um dom singelo. A economia capitalista solapa os sentidos mais profundos e instaura a medida do consumo como determinante da felicidade. Oferecer um presente a alguém pode, por vezes, responder mais a uma obrigação social e cultural que o sentido de marcar com gratidão e bem-querer a pessoa presenteada.
Ora, entre presente e presença há uma relação profunda que não pode ser transcurada. Quem oferece presente quer estar presente. E o dom oferecido torna-se símbolo de uma presença que marca a história da pessoa. No contexto do Natal, ao presente se agrega o sentido do amor de Deus que nos presenteou com seu Filho. E em tantas outras ocasiões, expressa-se, com o presente, o afeto, o carinho, a amizade para com o outro.
Infelizmente, a cultura consumista esvazia e empobrece a ritualidade do dom. Talvez porque a maioria dos presentes são mercadorias e cada vez menos são produzidos por quem os oferta. No entanto, muito mais grave é a sensação de ter cumprido uma obrigação ao dar um presente e se afastar da pessoa. Mais vale a presença que o presente. E para os pais, não adianta cumular de presentes seus filhos para compensar ausências. Presentes não educam, não amam, não falam, não escutam… Pais, ofereçam, sim, presentes aos seus filhos. Mas, antes de tudo, ofereçam a sua presença. Ela não será roubada do coração deles.